Impacto Produtivo e Económico do BVDV e IBR nas Explorações Leiteiras | Informações Técnicas


BVDV (Vírus da Diarreia Viral Bovina)

O BVDV é um vírus que afecta os bovinos de produção de leite e de carne, entre outras espécies animais.

Trata-se de uma doença que existe em todo o Mundo. No que respeita aos Açores, existe uma elevada prevalência (% de animais positivos), demonstrada pelas análises de sangue efectuadas pela DRDA: 57,5% no total das 9 ilhas (31106 animais testados) e de 63,9% em S. Miguel (7526 animais testados). Em relação à percentagem de explorações consideradas positivas, encontraram-se 84,2% no arquipélago (1731 explorações testadas) e 97,9% em S. Miguel (141 explorações testadas). (Fonte: Direcção Regional de Desenvolvimento Agrário, Maio de 2008) 

 

Como é que os animais se infectam com BVD?

Os animais infectam-se por contacto directo com animais já infectados (saliva, leite, urina, sémen, fezes, secreções oculares e nasais), materiais infectados (ex. agulhas) ou alimentos. Outra via de infecção é através da mãe, durante a gestação. Os principais responsáveis pela disseminação do vírus são os chamados 'Persistentemente Infectados', mais conhecidos por PI.

O que são animais PI?

São animais que foram infectados com BVDV, dentro do útero materno, nos primeiros 4 meses de gestação (o vírus passa da mãe para o filho através da placenta). Estes animais ficam com o vírus alojado dentro de si durante toda a sua vida, eliminando-o continuamente e infectando os outros animais da exploração. Em muitos casos, os animais PI são aparentemente normais, não se distinguindo dos outros animais da exploração (crescimento e estado de saúde). A única maneira de os identificar é através de análises realizadas em laboratório. São um ponto-chave no controlo desta doença. Ver (Fig. 1).

Consequências da circulação do BVD numa exploração?

As principais consequências deste vírus são infertilidade, abortos e diminuição das defesas dos animais.

O vírus BVD diminui as defesas dos animais (imunossupressão), ficando estes mais susceptíveis às outras doenças (diarreias, pneumonias, mamites, metrites, etc), havendo um aumento do número de casos e gravidade dos mesmos, na exploração.

Existe uma manifestação grave da doença, que afecta os animais PI, chamada de 'Doença das Mucosas' que, felizmente, é rara. Os sintomas principais são diarreia severa, febre e aparecimento de úlceras na boca. Na maioria dos casos, os animais afectados pela "Doença das Mucosas" acabam por morrer.

Na vaca reprodutora existem vários problemas causados pelo BVDV: morte embrionária, aborto em qualquer fase da gestação, nascimento de vitelos com malformações (Fig. 2), nascimento de vitelos fracos (atrasos de crescimento em relação a vitelos saudáveis), mumificação fetal, infertilidade (dificuldade em ficar gestante).

O vírus BVD pode infectar o touro reprodutor, alojando-se nos testículos e sendo eliminado pelo sémen. Como consequências, temos diminuição da fertilidade do touro e risco de infectar a vaca através da cobrição, levando a diminuição das taxas de concepção e gestação da exploração.

Durante os anos eu que trabalhei como veterinária de campo em S. Miguel, tive a oportunidade de verificar a existência de todos estes problemas causados pelo BVDV, o que me levava a suspeitar que existiam muitas explorações com este problema.

Impacto económico na exploração

Os prejuízos económicos numa exploração com BVDV são vários: produtivos (perdas de produção de leite, aumento do nº de dias em aberto, diminuição da qualidade de leite, atrasos de crescimento dos animais, etc), reprodutivo (mortalidade embrionária e abortos, infertilidade, baixas taxas de concepção, custos extra com sémen, etc), custos com tratamentos veterinários, refugos e mortes de animais.

A existência deste vírus na exploração acarreta elevadas perdas económicas, podendo haver perdas que rondam os 60 a 100 euros/vaca/ano e perdas de 10.7 a 19 euros por cada 1000 L de leite.

Prevenção e Controlo da Doença

As principais medidas de prevenção e controlo do BVDV são a identificação e eliminação (refugo) dos animais PI da exploração (eliminando desta forma a principal fonte do vírus da exploração) e a vacinação do efectivo.

A escolha da vacina adequada para a exploração, depende da realidade da mesma, e, é uma decisão que deve ser tomada conjuntamente entre o veterinário assistente da exploração e o proprietário, a partir das vacinas disponíveis no mercado nacional. Numa perspectiva técnica, considero importante que a vacina a utilizar tenha como atributos fundamentais: impedir o aparecimento de novos animais PI na exploração (vacinando animais reprodutores para evitar a infecção do vitelo durante os 1º 4 meses de gestação, proteger animais que não têm defesas contra o BVDV (nunca entraram em contacto com o vírus), possa ser utilizada num protocolo simples, não implicando muitas intervenções anuais.

Existem outras medidas de controlo como: evitar entrada de animais já infectados na exploração (fazendo teste à doença prévio, não comprando animais PI), evitar contacto com animais de outras explorações, adopção de medidas de higiene adequadas. Dada a realidade e as condições das explorações leiteiras açorianas, estas últimas medidas podem ser muito difíceis de implementar, sendo eu de opinião, que as medidas mais fáceis de aplicar são a eliminação de PI e a vacinação do efectivo.

 

IBR (Rinotraqueíte Infecciosa Bovina)

 

O IBR é uma doença causada por um vírus (Herpes Vírus Tipo 1). Trata-se de uma doença altamente contagiosa dos bovinos de leite e de carne.

É uma doença que existe a nível mundial, tendo uma elevada prevalência (% de animais positivos e de explorações que têm a doença) em S. Miguel e também nas outras ilhas do arquipélago.

Em alguns países europeus (Dinamarca, Finlândia, Suécia e Áustria), está considerada erradicada (ausência da doença), após implementação de planos de erradicação nacionais e obrigatórios.

 

Como se contagiam os animais?

A infecção ocorre principalmente, por contacto directo com animais infectados, através do ar, corrimentos nasais, corrimentos oculares, corrimentos uterinos, leite e sémen. Pode ocorrer transmissão por via sexual (sémen infectado), que pode ter grande importância em explorações que recorrem à cobrição natural, havendo necessidade de controlo adequado dos touros reprodutores.

Os animais infectados podem tornar-se portadores do vírus por toda a vida, ficando o vírus como que 'adormecido' (infecção latente). Em períodos de stress ou na existência de outra doença (ex. mamite, metrite, etc), ocorre uma diminuição das defesas do animal (imunossupressão), e, o vírus pode 'acordar' (reactivação), podendo exibir sintomas de IBR, de gravidade variável. Nesta fase, eliminam o vírus para o meio ambiente, havendo um risco elevado de infectarem animais saudáveis, podendo, em algumas condições, surgir um surto de IBR na exploração.

Sinais clínicos de IBR

Os principais sintomas de IBR são respiratórios (tracto respiratório superior). Os animais apresentam febre, corrimento nasal e ocular (conjuntivite), salivação, quebra na produção leiteira grave. Um sinal característico é o chamado 'nariz vermelho', devido ao aparecimento de úlceras (feridas) à volta das narinas (Fig. 3). Este quadro de doença pode agravar-se e evoluir para pneumonia.

O vírus IBR também pode provocar doenças do aparelho genital: Vulvovaginite Pustular Infecciosa (IPV), nas fêmeas (Fig. 4), e, Balanopostite Pustular Infecciosa (IPB), nos machos. Em ambos os casos os animais têm febre, lesões na vulva nas fêmeas, no pénis e prepúcio nos machos. A fertilidade dos animais reprodutores pode ficar diminuída. As vacas reprodutoras podem sofrer aborto, casos isolados ou em forma de surto, ocorrendo na maior parte das vezes entre o 6º e o 8º mês de gestação.

Nos vitelos, a IBR provoca a forma respiratória já referida mas também pode causar diarreias (enterites) e por vezes sintomas nervosos em vitelos recém-nascidos.

A entrada do vírus IBR numa manada adulta de vacas leiteiras, que não tenha tido contacto prévio com a doença (animais negativos nas análises de sangue), pode causar problemas graves de IBR como abortos (podendo atingir 25 a 60% das vacas gestantes), sintomas respiratórios graves, quebras severas na produção de leite e mesmo morte. Os surtos de IBR podem afectar grande nº de animais. Frequentemente observei em explorações, nos Açores, grupos de animais numa exploração, ao mesmo tempo, com os sinais característicos de doença respiratória provocada pela IBR (febre, corrimentos nas narinas e olhos e grandes quebras na produção de leite). Quando estes animais começavam a recuperar, podia aparecer novo grupo de animais com os mesmos sintomas, possivelmente, tinham sido infectados pelos primeiros.

Impacto económico da IBR

Em todo o mundo, o vírus IBR provoca milhões de euros de prejuízos devido a quebras na produção leiteira (pode baixar até cerca de 14 L/vaca/dia), problemas de fertilidade, abortos, custos com tratamentos veterinários, refugos e mortes.

Medidas de controlo de IBR

O controlo desta doença passa por:

- Identificação dos animais portadores do vírus e seu refugo (nem sempre possível);

- Evitar a entrada do vírus na exploração (evitar compra de animais já infectados, realizando análises de laboratório para pesquisa de IBR, desinfecção de materiais que possam estar infectados, evitar contacto com animais de explorações infectadas, etc);

- Vacinação de todo o efectivo com o objectivo de travar a disseminação do vírus (diminuindo a eliminação do vírus para o meio ambiente de animais portadores), prevenção de sintomas (animais vacinados que sofram infecção, as consequências da doença serão de menor gravidade ou inexistentes). Os animais previamente vacinados, se entrarem em contacto com vírus, têm maior número de 'armas' (defesas) para lutarem contra a IBR, evitando casos de doença severa e diminuindo o prejuízo na rentabilidade da exploração. A escolha da vacina adequada para a exploração, depende da realidade da mesma (ex. existência ou não de mais doenças na exploração), e, é uma decisão que deve ser tomada conjuntamente entre o veterinário assistente da exploração e o proprietário, a partir das vacinas disponíveis no mercado nacional.

 

Bibliografia

- Rebhun W. (95), Diseases

of Dairy Cattle.

Williams & Wilkins

- Radostits, O. M. et al,

Veterinary Medicine (00).

W. B. Saunders

- Andrews, A. H., Bovine Medicine -.Diseases and Husbandry of Cattle (92). Blackwell Science

- Fourichon C. et al, 'Quantification of economic losses

consecutive to infection of a dairy herd with bovine viral diarrhoea virus' (05). Preventive Veterinary Medicine, Elsevier.

 

Deolinda Silva

Médica Veterinária

Serviços Técnicos - Pfizer Saúde Animal